Introdução:
Este
projeto tem como objetivo pesquisar e trabalhar as linguagens dos protestos e
manifestações que ocuparam o país com palavras e ideias neste ano de 2013 em
sala de aula com uma análise linguística e discursiva mais do que por qualquer
outro traço com o objetivo de observar que o que se vê nas situações de
espontaneidade é a “língua viva”, com a sua gramática, que nem sempre coincide
com a norma culta (de prestigio), além da importância de oferecer ao aluno a
capacidade de distinguir e escolher os diferentes usos da língua em
determinados momentos, avaliar o gênero e suas composições.
Nosso
ponto de partido foi a análise feita em revista especializada em língua
portuguesa publicada à época dos protestos populares no ano de 2013. Assim
Murano (2013), Godoi (2013) e Possenti (2013) sugeriram análises dos cartazes,
faixas e gritos de guerra dos manifestantes que tomaram as ruas do país naquele
momento.
Como
analisaremos um gênero, buscamos apoio teórico em Schneuwly (2004). Como nosso
olhar se atentará para as questões da variabilidade da língua, também nos
apoiaremos em Camacho (1988). Todos esses autores apresentam os seus objetos de
estudo em perspectiva que pretende colaborar para a criação de propostas de
ensino-aprendizagem de língua portuguesa. Também compartilhamos desse objetivo
como veremos, o que justifica a escolha desses trabalhos como suporte teórico.
A
metodologia que propomos passará pela constituição de corpus de análise com os textos dos cartazes de protesto. Em um
primeiro esforço feito antes da finalização do presente projeto, recolhemos inicialmente
cerca de 50 frases encontradas e registradas nos protestos a partir de Junho
2013 e disponíveis na internet através de redes sociais, reportagens e tiradas
pelos próprios manifestantes. Nossa proposta é realizar um trabalho que analise
o texto em sua multiplicidade, a começar pelos conteúdos que expressam,
configurando análises semânticas e pragmática-discursivas, análise do estilo da
linguagem e de sua expressividade, e, finalmente, avaliação de aspectos
morfossintáticos e lexicais que apontem para a variabilidade da língua
portuguesa no gênero que ora enfocamos.
Objetivo:
O
objetivo geral da pesquisa que propomos é fazer uma descrição dos cartazes como
objeto complexo da língua, expressão da heterogeneidade da língua, e, por fim,
apreender toda a sua potencialidade como objeto mediador de propostas de
ensino-aprendizagem de língua materna.
Como
objetivos específicos, podemos mencionar que visaremos:
1. A
descrição dos cartazes do ponto de vista semântico, pragmático e discursivo.
Que conteúdos trazem? Que estratégias textuais e discursivas se utilizam para veicular
suas mensagens “subversivas” e de protesto.
2. A
descrição dos cartazes evidenciando a variabilidade morfossintática da língua
portuguesa. Qual a configuração da norma gramatical dos protestos? E que
medidas essa norma se distancia ou se aproxima da chamada “norma-padrão”?
3. A
proposição de atividades de ensino-aprendizado a partir dos cartazes. Como em
sala de aula é possível explorar esse gênero como objeto de desenvolvimento da maestria dos objetos linguísticos e,
portanto, de ampliação da “competência comunicativa” dos alunos?
Justificativa:
A língua portuguesa do Brasil é
marcada por sua grande heterogeneidade e variabilidade (CAMACHO, 1988). A busca
de materiais que permitam explorar esses aspectos é fundamental e urgente. A
escola não pode no mundo atual se furtar a aproveitar a multiplicidade e
diversidade de materiais com os quais seus alunos lidam. Se não estiver atenda
ao fato de que a língua é objeto complexo, que vai muito além da imposição de
um padrão de norma oferecido como fórmula única de uso da língua, estará
perdendo a oportunidade de, de fato, colaborar para ampliação da competência
comunicativa de seus alunos.
O ensino através dos gêneros
discursivos é mecanismo bastante apropriado para tratar a língua em sua
multiplicidade (SCHNEUWLY, 2004). Por meio de atividades didáticas que coloquem
os alunos não somente com os aspectos técnicos do texto, mas também explorando
sua função de instrumento simbólico através do qual as interações sociais se
constituem, a escola tem a oportunidade de oferecer ao aluno matéria que
permita seu crescimento acadêmico e pessoal.
Os cartazes de protestos têm nesse
sentido um enorme potencial didático. Escritos por jovens, devem conter uma
norma gramatical carregada de usos que ora se distanciam ora se aproximam da
“norma-padrão”. A partir desse material, os alunos podem refletir sobre as
normas por trás dos usos linguísticos, dando-lhes consciência sobre as escolhas
linguísticas mais adequadas em cada contexto de uso. Refletindo sobre as
questões sociais, políticas e econômicas, podem ser o ponto de partida para
discussões de como a língua constrói discursos, carregados de ideologias e
“verdades”, matéria para desenvolver a capacidade crítica de alunos, em suas
atividades de leitura crítica.
Metodologia:
Para
a pesquisa que aqui propomos, constituiremos um corpus de análise com frases de
cartazes que circularam nos protestos recentes que marcaram a História do
Brasil. Esse corpus já está previamente formado inicialmente com cerca de 50
diferentes cartazes retirados em sites e redes sociais e, analisados por
Possenti (2013). Outros cartazes que recolheremos ao aprofundar nossa pesquisa
ampliaram este material de análise, caso seja necessário.
Cada
cartaz passará por análise nos seguintes níveis, seguindo a proposta de
Schneuwly (2004):
Análise
do seu conteúdo: identificação de estratégias semânticas, pragmáticas e discursivas
utilizadas pelos autores para “vender” suas ideias e ideologias.
Análise
do estilo da linguagem: a questão da formalidade, o uso de figuras de linguagem
e ferramentas estilísticas.
Análise
da composição linguística: as escolhas lexicais e morfossintáticas feitas por
seus autores na produção textual dos cartazes. Essas escolhas serão observadas
com perspectiva variacionista, e poderão ser quando necessárias contratadas à
norma-padrão.
A partir dos aspectos
analisados, conforme descrevemos anteriormente, realizaremos como última parte
de nossa pesquisa, a proposição de atividades de ensino-aprendizagem que tomem
o gênero cartazes de protesto como objetos didáticos, em uma visão dialógica e
sócio-interacionista, conforme proposta de Schneuwly (2004).
Fundamentação teórica:
Nossa
base teórica fará a avaliação e definição de gêneros segundo os estudos de
Schneuwly (2004), para que possamos entender como funciona as escolhas
linguísticas e discursivas em determinadas situações e o quanto elas falam por
si só. Este autor, seguindo a tradição
bakhtiniana, sustenta que cada esfera de troca social elabora tipos
relativamente estáveis de enunciado, sendo estes os gêneros, logo três
elementos o caracterizam: conteúdo temático – estilo – construção composicional
e que a escolha de um gênero se determina pela esfera, as necessidades da
temática, o conjunto dos participantes e a vontade enunciativa ou intenção do
locutor.
A
caracterização do primeiro elemento é a escolha de um gênero em função de uma
situação definida por um certo número de parâmetros: finalidade, destinatários,
conteúdo, dito de outra maneira, existe primeiramente a elaboração de uma base
de orientação para uma ação discursiva. Assim então, na segunda caracterização,
essa base chega à escolha de um gênero num conjunto de possíveis, no interior
de uma esfera de troca dada, num lugar social que define um conjunto possível
de gêneros. A construção composicional se dá pelo fato de que os gêneros,
apesar de serem “mutáveis, flexíveis”, eles tem uma certa estabilidade que
definem o que é dizível, tendo uma composição: tipo de estruturação e
acabamento e tipo de relação com os outros participantes da troca verbal, sendo
então a estrutura definida por sua função. Gramática e léxico, por um lado, e
estilística, por outro, separam-se essencialmente pelo ponto de vista que os
define: língua de um lado, gênero de outro. Esse plano comunicacional será
caracterizado por um estilo, que deve ser considerado não como um efeito da
individualidade do locutor, mas como elemento de um gênero.
Já
Camacho (1988) nos explica que a linguagem humana varia de acordo com o grau de
contato entre os seres que constituem a comunidade universal, e que as
diferenças de um idioma, que caracterizam ou mesmo identificam os nativos de
uma nação, estão longe de ser o único e mesmo principal fator da diversidade
linguística. Uma língua é um objeto histórico, enquanto saber transmitido
estando, portanto, sujeita ás eventualidades próprias de tal tipo de objeto.
Isso significa que se transforma no tempo e se diversifica no espaço. Um outro
exemplo: sem sair das fronteiras políticas brasileiras, é possível também
identificar um nordestino e distingui-lo de um paulista pelo seu modo
característico de falar.
Os
fatores desta diversidade linguística não ficam assim limitados aos aspectos
temporal e espacial. Podemos identificar e distinguir dois falantes de uma
mesma comunidade linguística, geograficamente falando, por suas características
decorrentes de diferentes níveis culturais, ou seja, havendo diferenças no modo
de se expressar entre um indivíduo iletrado a um outro com nível cultural
mediano ou altamente cultivado e mais, um sujeito que se dirige a um dos
membros da família, em nenhuma hipótese usará as mesmas formas de outra
situação em que se encontre perante um superior hierárquico, ou seja, ele sabe
fazer as melhores escolhas dependendo de sua situação de uso / contexto.
Em
resumo, Camacho (1988) define que no seio de um mesmo instrumento de
comunicação existem quatro modalidades especificas de variação linguística:
histórica ou diacrônica, geográfica ou espacial, social e estilística.
Resultados esperados:
Com
a pesquisa e realização deste projeto, espero encontrar uma linguagem que não
se curva a norma culta, uma linguagem formada por jargões e fórmulas que se repetem
e / ou uma linguagem que faz uso de figuras estilísticas que ora se aproxima da
poesia e da propaganda (slogans), uma linguagem que define uma geração e uma
época e quais variações linguísticas envolvidas conseguiremos definir e/ou
deduzir através da realização destes cartazes.
Também
esperamos evidenciar que tais materiais discursivos podem ser amplamente
utilizados em sala de aula, de modo que a escola possa cumprir com eficiência
seu objetivo maior no ensino de língua materna: a ampliação da competência
comunicativa de seus alunos.
Referências Bibliográficas:
CAMACHO,
Roberto G. – “A variação linguística”,
in subsídios à proposta curricular de língua portuguesa para o 1º e 2º graus.
Secretaria de estado da educação - São Paulo, SP. CENP, 1988.
GODOI,
Marcílio – “A irreverência que dá cartaz”,
in revista língua portuguesa, Ano 8 nº 94, Agosto de 2013 – Ed. Segmento – São
Paulo, SP.
MURANO,
Edgard – “A linguagem dos protestos”, in
revista língua portuguesa, Ano 8 nº 94, Agosto de 2013 – Ed. Segmento – São
Paulo, SP.
POSSENTI,
Sirio – “Leitura das ruas”, in
revista língua portuguesa, Ano 8 nº 94, Agosto de 2013 – Ed. Segmento – São
Paulo, SP.
SCHNEUWLY,
Bernard – “Gêneros e tipos de discurso:
considerações psicológicas e ontogenéticas”, in gêneros orais e escritos na
escola / tradução e organização Roxane Rojo e Glais Sales Cordeiro – Campinas,
SP: Mercado de Letras, 2004- (as faces da linguística aplicada).